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Introdução ao Catálogo Exposição Galeria Nasoni, Lisboa - 1989

 

Que não sou um pintor, mas só alguém que também pinta. Que não pinto para expor, para me exibir, muito menos para ven­der. Velhos passes de defesa, que, como se vê, falharam. Volto a página.

 

Não se junta nesta sala o que fiz durante quase cinquenta anos. Nem nela caberia. Nem certamente interessava. Muitos e muitos quadros, muitos mais dos que hoje existem por aqui e por aí, destruíos eu próprio por raiva ou decepção. Infelizmente, penso às vezes. Ou deveria ter feito o mesmo a todos?

 

Quem cedeu alguma vez ao apelo da fala sem palavras que a pintura é, há-de entender-me, espero.

 

Esta exposição servirá ao menos para mostrar quanto o carimbo de «receita» e de «anti-arte moderna», tão repetidamente aplicado ao neo-realismo dos anos 40, será, no meu caso também, bem pouco rigoroso. E, ao mesmo tempo, como tudo no meu trabalho plástico foi (e é) antecipação e sequência da poesia de Memória dum Pintor Desconhecido, publicada em 65. Insinuada já em esquecidas tentativas, que descobri há pouco, de entre 41 e 44.

 

A pintura seria o paraíso se não fosse a consciência das nos­sas limitações. Consciência e criação não se querem muito juntas. Mas, mesmo assim, bendita seja ela, essa consciência.

 

Quantas afinidades! E, frequentemente, simultâneas! Não posso assim falar de fases, de influências, a propósito do que fiz e estou fazendo, mas antes de sinais dum gosto incorrigível de brin­car com o lume, o meu vício maior. Por isso me deslumbrarão tanto um Uccello como um Rembrandt ou um Turner, um Bonnard como um Braque ou um Bissière (nem falemos de Picasso e de Van Gogh, onde tudo começou), um Szènes como um Pomar, um Appel ou um Tàpies, um Wols, o Asger Jorn da «Carta ao meu filho», não mais acabaria. E a sedução dos chamados «pequenos mestres»?

 

É natural que um artista procure inventar uma maneira e a cul­tive. Mais valerá copiar-se a si próprio do que a outros, afinal. Isso lhe facilitará a execução e o libertará das amargas incertezas que a pesquisa permanente traz consigo. Mas eu nunca senti essa humana tentação de fabricar uma receita e de explorá-la, saiba embora quanto isso faz perder em rapidez de produção e em êxito possível. Mas que quer dizer êxito? Para que serve?

 

Vou caminhando sem destino e sem repouso. Gostando sem­pre pouco do que pinto, precisando sempre muito de pintar. Assim foi, certamente assim será. Não ambiciono mais.

 

Mário Dionísio

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